sexta-feira, 9 de abril de 2010

Aqui jaz a mentira

“Fica decretado que agora vale a verdade.
que agora vale a vida
e que de mãos dadas
trabalharemos todos pela vida verdadeira.”

(Os estatutos do homem, de Thiago de Mello)


A mentira está morta. Anunciam os corações puros e as almas cálidas. Não fui ao cortejo fúnebre, tampouco atirei pétalas de rosas em seu túmulo. Soube apenas, pela boca de terceiros, que ela sussurrava agonizantemente antes da partida. De seu leito, ouviam-se os soberbos sons: “Ninguém sobreviverá sem mim. Estou entranhada em cada homem e em cada mulher como o sangue jorrado nas veias”.

Quão pretensiosa era a mentira! Passou toda a vida a julgar-se a nossa substância inata, seiva de nosso espírito. Envenenou amizades, sentou à mesa fáustica dos governantes, talhou a bandeira das vaidades e fez lacrimejar tantos rostos de amantes inseparáveis. Nas pútridas guerras, lá estava a entrincheirar seus paladinos e a promover carnificina. Mas, hoje, a mentira não é mais que um punhado de cinzas soterrado na infinita grandeza da humanidade.

A implacável lei da natureza, com destinos transcendentes e aparições casulares, tratou de nos redimir. Nunca mais as infidelidades, as trapaças e os sonhos adiados. A sete palmos, a verdade se enraizou e vai crescendo até desabrochar nos jardins não cultivados de nossas virtudes. A partir de agora, colheremos seus frutos e beberemos de seu néctar.

Os povos estão irmanados numa única língua, numa única palavra. Em nome da verdade, extinguiram-se os conflitos fratricidas e a imperiosa acumulação de riquezas. De penitência cruel, o trabalho se transformou na satisfação das potencialidades de cada ser humano, alimentando e harmonizando comunidades inteiras. Passamos, então, a desfrutar dos mais simples e essenciais prazeres. É a chegada da boa nova: já não somos mais lobos de nós mesmos.

Derramando a última pá de terra sobre o corpo da falsária, a mão amiga aponta para um caminho reluzente, por onde todos seguirão em comunhão. Está aberta a vereda da verdade, prenhe de pureza e justiça.


Por Leonardo Costa, cronista episódico.

Nenhum comentário:

Postar um comentário